segunda-feira, 16 de maio de 2011

O Medo de quem escreve


Quando comecei a escrever, não tinha computador, até por que ter computador não era uma coisa comum. Também não tinha máquina de escrever. Escrevia num caderno ou em folhas ofício reaproveitadas, hábito que volta e meia ainda cultivo. Depois do original, que eu até hoje insisto em chamar de rascunho, passava a limpo para um caderno, com letra bonita e sem direito a erros. Com exceção de meu primeiro texto: "Banguelinha, não!", que escrevi numa olivetti. Os outros até o momento da cena chegavam nas mãos dos atores a xerox dos manuscritos. E quando eu atuava, o original era meu! Durante anos a fio fui guardando meus textos em uma caixa... Não qualquer caixa! Uma caixa especial que eu mesma, forrei e com pedaços de jornal...Uma caixa que também era um pouco um manuscrito.

Alguns deles eu colocava numa pasta azul... No intuito de publica-los levei certa vez para Porto Alegre dentro da tal pasta...E esqueci ela dentro do ônibus...Foi um dos momentos mais assustadores da minha vida. Existem muitas coisas nesta vida, que temos como recuperar. Um telefone, uma carteira...Mas uma pasta de textos que um dia nasceram de um momento mágico de inspiração ou que foram estudados e reestudados até tornarem-se o que são... Não se vende e não se encontra em lugar nenhum.

Por sorte ( e por precaução) havia o número de meu telefone na pasta. E no mesmo dia localizei- a entre lágrimas e diante do vazio ia em mim. Acabei por não levar meus textos ao tal editor. Entendi aquela perda como um sinal. E eles voltaram para minha caixa mágica e especial.

Anos mais tarde, quando comprei meu primeiro computador. Iniciei o processo de digitalização.
 Formatando com o maior carinho. Foi quando veio a idéia de meu sobrinho atualizar o computador.
 Quase tudo que havia sido digitalizado, foi perdido, ou embaralhado...Como se um vento tivesse levado páginas, e se desse ao direito de deixar comigo apenas umas páginas de todo trabalho de um ano inteiro...
Nesta mesma época tive que me mudar, e por segurança levei minha caixa, e todas as minhas coisas ... também em caixas, para a dependência de empregada do apartamento de minha mãe.
Que foi vendido uns dois anos depois. E meus textos?
Foram parar na garagem da mãe de uma amiga de minha irmã. ..
Acho que não preciso dizer que não dormi bem durante os 22 meses que meus textos e todas as caixas com meus livros, figurinos e adereços estiveram guardados lá. No último dia 9 de maio cheguei a porta da tal garagem para retirar de lá minhas coisas. Enquanto a mãe da amiga de minha irmã não aparecia, minha irmã me preparava para o pior. Foram dos momentos mais difíceis de minha vida...
Ao abrir-se a garagem...eu não era eu...Era só mais uma personagem de minhas histórias... diante de uma caverna escondida, em busca de sonhos que um dia criei...buscava não uma caixa, mas uma arca de ouro...
E lá estava ela, um pouco amassada, empoeirada...mas com todos os meus textos...Não sabia se ria ou se chorava... Vontade louca de dançar, cantar ... pular...

No mesmo dia chamei uma transportadora, mas meus escritos foram comigo, de ônibus, dentro de uma bolsa e enrolados em sacolas e mais sacolas de plástico...por precaução...

A minha caixa ... ficou na terra natal... a caixa dos escritos de Lucy...

mas o conteúdo dela está aqui ... ao meu lado, ao alcance dos olhos... e vou revelar ...lá há muitos textos mais que os que descrevi na lista da barra lateral ...

O medo de quem escreve... o maior medo ... é este ...das palavras perderem-se ...
é o medo do mofo...seja nos manuscritos ou nos livros esquecidos pelos leitores de uma era em que temos um mundo com um clic...

agora que tenho meus escritos ao alcance da mão vou lê-los novamente, digitá-los...e publicá-los...acho que é o momento...

O prazo que me dei para esta façanha é de um ano.

Um certo medinho segue, é claro... mas uma página foi virada...

e posso afirmar que o medo da aceitação por parte do público sempre será menor do que o medo do mofo!!!

Para finalizar este post, não serei criativa, direi apenas o que vários alguéns já me disseram em momentos difíceis da vida...

"Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima!"

Já levantei, peguei minha caixa, meus escritos, sacudi a poeira...

agora dêem-me licença, que vou dar a volta por cima!!!